terça-feira, 23 de novembro de 2010

Se o rádio não toca...


Como diria o escritor e poeta francês Victor Hugo “A música é o barulho que pensa”. É também o barulho que nos faz pensar, refletir, mudar. É mais que uma terapia. É arte. E a arte é o grau mais alto da capacidade humana, como diria Tom Zé.
A música conta muito a história e a cultura de um povo. Identifica épocas, marca gerações, cria ídolos, eterniza gênios e mitos.
Mas porque eu estou tocando no assunto música? A partir de hoje eu vou começar a postar algumas letras que me chamam atenção pela sua estrutura e pela sua história dentro um contexto. E a partir daí, espalhar um pouco mais dessa magia que a música nos traz.
Hoje eu estava ouvindo uma música de Raul Seixas, pouco famosa, mas com uma mensagem direta e sutil. Ela se chama “Réquiem para uma flor” e como na maioria das músicas de Raul a mensagem vem através de metáforas. Ela começa assim:

“Fruto do mundo
somos os homens.
Pequenos girassóis
os que mostram a cara,
e enorme as montanhas
que não dizem nada”

            Eis aí um retrato simples e poético da visão de Raul sobre a humanidade. Alguns que sonham em mudar algo no mundo e que dão a cara a bater por essa mudança, estes representados pela figura de um girassol. São geralmente os loucos, os diferentes, os utópicos, os grandes pensadores, que se diferenciam e se destacam das grandes montanhas que não dizem nada.
            Mas ao mesmo tempo, alguns desses girassóis podem não florescer devido a grande sombra que as montanhas fazem. A pressão da sociedade, a repressão dos conservadores, o modo como nossas crianças aprendem a perder o senso criativo e tantas outras questões que implicam em fazer alguns girassóis não passarem de mais uma planta qualquer nessa grande montanha. Como o título mesmo diz réquiem para uma flor. O termo réquiem seria uma missa composta especialmente para um funeral, nesse caso a morte da flor, a morte de mais um girassol.
            Por fim, Raul fecha com uma frase em espanhol que diz “Incapaces los hombres que hablam de todo e sufrem callados”. Traduzindo: “Incapazes os homens que falam de todos e sofrem calados”. Essa frase complementa o que ele quis dizer nos primeiros versos, fechando esse poema de forma genial. Representa a inveja das montanhas em ver o belo girassol florescer. Algo tão comum no nosso cotidiano, em que se vêem as pessoas julgando a felicidade dos outros, querendo definir o que é certo e errado, sem se dar conta no rumo que a sua própria vida está seguindo.
            Façamos que se floresçam mais girassóis! Plantemos a criatividade, a arte, a cultura, o bom senso e esperemos por um mundo mais florido e melhor.


Pra quem quiser ouvir, segue abaixo a música:

terça-feira, 9 de novembro de 2010

O dia de amanhã

- De repente, eu acordo, e me vejo com 83 anos. Um sonho? Não, completamente o contrário. E o que antigamente, lá pelo começo dos anos 2000 parecia ruim, piorou.
            Em pleno ano de 2075 o mundo vive abalado, porém, um pouco aliviado com o final da 3ª Guerra Mundial. O motivo dela? A água. E o pior de tudo, é que o Brasil que tem água em abundância foi o que mais sofreu.
            Cidades destruídas, famílias horrorizadas e a nossa honra arruinada. “Verás que um filho teu não foge à luta”, não foi bem isso que se viu nesse momento de terror. Quem tinha dinheiro saía do Brasil, ia para o exterior assistir pela televisão essa atrocidade. Enquanto que o povo brasileiro, o povo sofrido mesmo, se defendia como podia. Dava o seu jeito de sobreviver como sempre fez. Até porque se fosse para fazer um manual de sobrevivência, qualquer brasileiro colocaria aqueles apresentadores da Discovery e afins no chinelo.
            Realmente o que me deu uma lástima de esperança nesse triste período, foi ver esse povo se ajudando como podia. Pensava que o homem estava perdendo seus princípios. Perguntava-me até quais eram os princípios humanos. Quem é o homem na sua essência? O bem ou o mal iria prevalecer no caos? Enfim, eu vi um povo solidário até nos aparentes últimos momentos. Pessoas se doando pelos outros. Seria a fé do brasileiro? Seria a esperança de algo maior pra depois dessa vida? Pouco importa. O que fazia sentido naquele momento era ver que ainda temos chance. Temos chance de um mundo mais humano, mais altruísta, mais nosso, mais de todos.
            Eu me vejo aqui deitado nessa cama de hospital, enquanto um robozinho simpático vai colocando uma perna mecânica em mim. Foi triste acordar sem uma perna, depois de ver a minha casa derrubada por uma bomba. A minha velha não teve a mesma sorte, Deus escolheu ela pra viver melhor e mais tranquila ao lado Dele. Enquanto que para mim, Deus enviou um anjo numa roupa de bombeiro, que me tirou dos destroços e salvou minha vida.
            Um triste fim pra um velho como eu. Já não sei o que fazer sem minha companheira, sem nosso lar que nos abrigou durante nossos 61 anos de casado, que guardava todas nossas lembranças, histórias de vida. Todo o material da nossa história agora se limita a minha já fraca memória. Estou realmente confuso.
Porém, seria muita injustiça com aqueles que me salvaram se eu deixasse de viver a vida e de sorrir. Sei que me falta pouco tempo, mas nunca é tarde pra recomeçar. E depois de tanta destruição é tempo de recomeçar. Vou me fazer útil até o meu último suspiro, parafraseando Raul sei que minha cabeça não vai agüentar se eu parar. Tenho tanto pra ensinar, tanto ainda para aprender. Quero viver!
Sinto minha cruz pesando cada vez mais. Mas serei forte pra conseguir carregar todo esse sentimento de perda e de dor. Pois o homem que se prende ao passado é infeliz no presente, pois passado é para se recordar não para viver.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Deus abençoe o Nordeste!

“O nordeste elegeu a Dilma”. Cansei de ouvir essa frase após a eleição do último domingo. Além de outras afirmações que deixam claro que brasileiro é fanático em tudo. Quando perde acha desculpa pra isso e pra aquilo. Essa é a democracia que escolhemos para viver, é talvez o único momento em que o pobre tem o mesmo poder do rico. Talvez seja só na hora da eleição que os direitos e deveres do cidadão sejam posto em prática sem discriminação de classe, credo e cor.
É bom deixar claro que não foi por causa do Nordeste que a Dilma se elegeu, até porque se pegarmos os números de votos somente na região Sul, Sudeste e Centro-Oeste veremos 51% de votos para Dilma e 49% para Serra, até porque em Minas Gerais e no Rio de Janeiro, que são dois dos maiores colégios eleitorais, a Dilma ganhou com certa folga.
Mas o mais triste é ver que ainda existem sentimentos bairristas em muitas pessoas. Tem gente que alimenta aquela história de separar sul do norte. Um sentimento tão cruel quanto o Nazismo de Hitler, ao querer se criar uma raça maior e melhor, o que de fato não existe. Vai haver pessoas sérias tanto no norte quanto no sul, assim como haverão pessoas injustas, desonestas e burras em todo lugar.
Nós vivemos rotulando as pessoas, e esse estereótipo que a maioria dos sulistas fazem com os nordestinos é altamente ignorante e preconceituoso. Tive a oportunidade de conhecer alguns lugares do nordeste e percebo que eles são tão guerreiros e trabalhadores quanto qualquer outro brasileiro e, além disso, sempre com o sorriso no rosto. Chico Anísio, tão respeitado humorista e nordestino, dizia que “o nordestino é o povo mais bem-humorado do mundo, pois devido ao sofrimento causado pela seca, é preciso rir para não chorar”.
Ariano Suassuna, Castro Alves, Jorge Amado e Graciliano Ramos. Gilberto Gil, Caetano Veloso, Tom Zé, Zé Ramalho, Belchior, Luiz Gonzaga e Raul Seixas. Chico Anísio, Tom Cavalcante e Renato Aragão. Todos grandes ícones da cultura brasileira. Todos nordestinos? Sim. E acima de tudo, todos brasileiros.
Esse país é nosso. É formado e influenciado pelas culturas de sul a norte. É essa miscigenação que faz do Brasil único. Saibamos nos respeitar e aprendamos a crescer com nossas diferenças. Pois é na diferença, na discussão, que se evolui, mas com inteligência, não com ignorância.